palavras chave: banda sonora: unidades semióticas temporais; modalidades musicais; símbolos, índices e ícones sonoros; "espaços" cinematográficos

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segunda-feira, 3 de novembro de 2008

Intromissão 1

Desta vez trago um pequeno filme. E pergunto: Se isto tivesse música, que tipo de música seria? Se possível especifiquem os instrumentos/timbres ou outros aspectos como a textura ou as harmonias/desenhos melódicos, etc...
Para mim este filme tem um significado, que não será o mesmo que vocês retiram da visualização. Após a vossa colaboração tentarei fazer o som seguindo as vossas opiniões.

Até breve!

Helder

segunda-feira, 6 de outubro de 2008

Sugestões

Olá! Aguardo sugestões de filmes que achem interessantes ver (e ouvir!) tendo em mente a ideia da música como criadora de significados relevantes para a percepção de espaços interiores (dentro da personagem), exteriores, transcendentes, superficiais, oníricos,... Bem sei que o termo espaço ainda não está bem esclarecido, mas tentarei fazê-lo em breve.

Bem-hajam, desde já!


Into the Wild (O Lado Selvagem, 2007)

Após uma análise da música presente nos filmes da Trilogia de Van Sant mencionados no primeiro post, ficou a vontade de continuar a reflexão “espacial” (primeiro móbil deste blog), se possível em filmes com algum contacto com aqueles três. Logo me chamou a atenção Into the Wild, realizado por Sean Penn, talvez por colocar um jovem isolado na natureza, o que igualmente acontece em Gerry (2002) e também de algum modo em Last Days (2005). O facto de Sean Penn protagonizar o próximo filme de Van Sant, Milk, também ajudou a formar a crença de que duas sensibilidades artísticas como são as destes dois cineastas lançarão um interessante futuro post sobre o Milk (alguém sabe quando estreia?).

Ao nível musical destaca-se claramente a quase constante presença de canções em bom estilo americano (penso que country não será o melhor termo), ora mais animadas ora mais em tom de recolhimento. Quando vi o filme pensei se seriam músicas escolhidas de um repertório já existente (o que ligaria claramente a este procedimento presente na Trilogia), mas não, foram canções compostas por Eddie Vedder (vocalista dos Pearl Jam), especificamente inspiradas na história do filme. Esta é baseada na opção de Christopher McCandless se retirar para a natureza, escapando da falsidade da sociedade e das aparências sustentadas pela sua família. O som puro americano, por vezes com a presença do banjo, mas sempre com a perseverança da guitarra (personificada em McCandless) denota o alcançado distanciamento de um mundo urbano.
Talvez por defeito meu não liguei às letras dessas canções, nem conheço os respectivos nomes, mas creio que o que interessa ao realizador são as modalidades que aquelas músicas conseguem produzir. Um exemplo: entendo que uma forte modalidade de saber, poder, ou - se preferirmos – conseguir, está presente na música que acompanha o primeiro dia no autocarro-casa. Nessa música o processo de começar com a guitarra e ir acrescentando instrumentos (não sei se existe um nome para isto; tipo Bolero de Ravel) transmite uma certeza e um domínio de algo que se está a (e se sabe) construir: uma nova vida, de independência.

Uma grande riqueza de significações sonoras acontece na própria alternância entre as mencionadas canções americanas e outros tipos de sonoridades, nomeadamente o tom intimista do quarteto de cordas ou alguns sons de sintetizador, mais dissonantes. Esta alternância não só facilita (algo que nem seria necessário) a percepção dos momentos temporais a que chegamos, após constantes flashbacks ou flashforwards, mas também acaba por clarificar o espaço interior dos principais personagens: McCandless constante, perseverante, puro, contemplativo, intocável; os seus familiares derrotados pela dor (e pela culpa, no caso dos pais), sofredores pela falta do filho e por isso com um grande vazio dentro deles.

O som da voz de sua irmã liga aos sons do quarteto de cordas de uma forma intimista, produzindo uma unidade semiótica temporal, sonora, chamada “em flutuação”. Estas unidades (UST), não tendo sido “descobertas” por pessoas ligadas ao cinema parecem-me muito interessantes e próximas do que será a linguagem dos realizadores, no momento em que indicam o tipo de música pretendido, eventualmente solicitada a um compositor. A unidade semiótica temporal “em flutuação” é descrita semanticamente da seguinte forma, resumida: o excerto musical, mesmo que faça surgir os sons de forma relativamente aleatória, não cria sentimentos de atenção, de “suspense”. Caberá ao compositor/designer sonoro apresentar soluções neste sentido. Em Gerry, de Van Sant, uma obra de Arvo Pärt para piano solo, cria também este “em flutuação que terá esta função de colocar os personagens numa “estrada sem saída”, à semelhança dos mencionados pais.
Se o realizador solicitar uma música que dê a impressão de ir até ao final de um processo (ou esforço), algo como uma elongação, submetida a tensão, criando um sentimento de atenção, estará a pedir a UST chamada distensão. Retornando à “Trilogia da Morte”: em Elephant, na cantina, Alex coloca as mãos na cabeça (sinal de espaço interior) perante o manipulado subir do volume do som envolvente. Este crescendo é o processo existente neste momento de “distensão”. No final de Into the Wild o processo é o acelerar de um ritmo regular (“cardíaco”) que culmina na percepção final de McCandless de qual é a Verdade que ele almejava. Este accelerando talvez seja símbolo de um coração – único, por acelerar no momento da morte – que realmente descobriu onde está a felicidade.

Verificámos então que o processo de estender as possibilidades de significação musical a sonoridades às quais normalmente não chamaríamos música é efectivamente empregue no cinema; de uma forma que lembra a “escuta reduzida” proposta por Pierre Schaeffer (fundador da “musique concrète”) e a análise de obras musicais electroacústicas (onde nasceu o estudo das UST). Alguns autores apontam esta música como importante meio de utilização sonora dos três tipos de signo (ícone, índice e símbolo), segundo Charles S. Peirce. É particularmente interessante constatar como, em Into the Wild, um simples som de sintetizador, tipo voz cantada, parece ser índice de destino divino, assinalado visualmente na impossibilidade de atravessar o rio e recuperar o chapéu outrora deixado para trás (chapéu como índice visual de um passado ao qual não retornará?).

Para terminar questiono: Que interpretação fazem dos sons cantados por vozes árabes-ciganas (?). O que significam?
E também: Como interpretar os sons alterados de ambulância e de ruído de cidade, quando McCandless procura um quarto para dormir, junto dos sem-abrigo?

terça-feira, 23 de setembro de 2008

A partir da Trilogia

Com este blog tento continuar a reflexão que comecei num trabalho realizado em torno da música/som em três filmes do realizador Gus Van Sant, conhecidos como “Trilogia da Morte”: Gerry, Elephant e Last Days. Nestes filmes considerei que a música - especialmente como veículo de significados - e os contextos visual e narrativo permitem-nos localizar um “espaço” ao qual ela própria (a música) fica associada. Assim, no que me pareceu uma exaustiva lista dos “espaços” oferecidos naquela Trilogia, temos momentos em que podemos dizer que: (1) a música é do foro psicológico/emocional da personagem – Espaço Interior; (2) a música se adequa à situação ou ao local – Espaço Exterior; (3) a música se relaciona com uma entidade divina ou forças sobrehumanas – Espaço Transcendente; (4) a música está acima da narração, criando uma superfície auditiva pura – Espaço Superfície. A esta separação em quatro espaços, acrescentei o “haver espaço” para que o tempo musical (mítico) se desenvolva (notoriamente, na Trilogia, pois Van Sant permite que obras musicais completas se oiçam).

Sabendo que não há grande novidade no afirmar, por exemplo, que a música espelha o interior da mente ou da alma do personagem (algo que as imagens não conseguem), pareceu-me que Van Sant, nos seus filmes, quer explicar como fazê-lo e clarificar que não será assim tão directa aquela associação, se não se recorrer aos meios necessários para tal. Não querendo aqui nomear estes meios e remetendo para aquele meu artigo (que em breve colocarei online) lanço o desafio de tentar encontrar um momento de um filme em que não tenhamos dúvida de que aquela música é o que se passa na mente do personagem.
Tentei uma primeira vez com o Psycho (versão de Van Sant, para estes efeitos exactamente igual à original de Hitchcock) porque facilmente encontramos escrito que o compositor Bernard Herrmann era mestre – o que não duvido – em acrescentar isto que as imagens não dizem: o interior dos personagens. Atrevo-me a dizer que nunca tal encontrei em Psycho (à luz da experiência de ter visto os 3 filmes de Van Sant). Se por momentos parece que um determinado plano sobre a personagem Marion Crane parece querer dizer que aquela música transmite a insegurança, o receio, a dúvida que se terá instalado no seu interior, logo uma mudança de plano – continuando a mesma música - nos parece dizer que afinal o que ouvimos tem um carácter premonitório, ao nível da narração que nos quer afectar como espectadores e esclarecer sobre o mundo que nos é dado a descobrir. Enquadro, assim, esta música para uma determinada situação, num “espaço exterior” ao personagem. Esta música, que respeita o universo visual criando um paralelismo sonoro é normalmente apelidada de música empática.
Lanço o repto de que me digam: acham que ela (a música empática) está normalmente associada a um espaço exterior ou conseguem referir exemplos de filmes onde percebemos outros espaços?

O desafio de continuar o estudo dos “espaços” fora da Trilogia mencionada instalou-se naturalmente em mim quando vejo filmes e confesso que às vezes não ligo tanto ao desenrolar da história como a alguns processos técnicos (aqui alguns se lembrarão que também em música dificilmente sigo as letras das canções).
Aceito que facilmente tenhamos que reformular esta separação em quatro espaços. De facto, num filme que vi recentemente, de Francis Ford Coppola, Uma Segunda Juventude (Youth Without Youth, 2007) temos claramente um trabalho sonoro diferente quando estamos a ver sonhos: um “espaço onírico” a acrescentar à lista? Mesmo que possamos dizer que aqueles sonhos têm origem em forças não humanas ou que – penso que o mais comum em nós – os sonhos têm ligação com o que pensámos e vivemos no dia anterior (de alguma forma ligada ao nosso passado), o que nos manteria com os espaços transcendente e interior, parece muito clara a distinção, neste filme, entre onírico e vivido, respectivamente expressos na abordagem de Walter Murch (edição sonora) e Osvaldo Golijov (compositor).


Para terminar relembro que o principal motivo deste blog é perceber como a música (nos variadíssimos estilos que o cinema emprega, não discriminatoriamente) significa e, ao significar, como estimula a nossa percepção dos mencionados espaços interior, exterior, trasncendente, superfície,.... A minha grande vontade é que surjam muitas opiniões e muitas interpretações sobre o assunto, pois cada um de nós tem uma maneira própria de assimilar a arte, o cinema, e a música de cinema. O primeiro repto era então: conhecem exemplos de momentos em que a música explica o que está dentro do personagem? É música empática ou anempática (contrária ou indiferente ao que vemos)?



Trailers dos filmes mencionados:

(Trilogia da Morte)
http://www.elephantmovie.com/
http://www.lastdaysmovie.com/
http://movies.nytimes.com/movie/260308/Gerry/trailers

Psycho (remake de Van Sant)
http://movies.nytimes.com/movie/174140/Psycho/overview

Uma Segunda Juventude (Coppola)
http://www.apple.com/trailers/sony/youthwithoutyouth/

Milk (Van Sant)
http://www.apple.com/trailers/focus_features/milk/